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A parada: uma luta social e política!

Por Anderson Lima*


O mês de junho chega e com ele as festas juninas despertam como um marco cultural brasileiro. Quermesses surgem trazendo uma pluralidade regional única dentro de cada cidade, bairro e quebrada espalhada pelo Brasil. São Paulo não é diferente: quadrilhas, quentão, vinho quente, canjica, arroz doce e muito mais; a cidade passa a receber sobre as ruas, praças, escolas e os quintais de igrejas a tradicional festa de São João, porém como bem sabemos, este mês é marcado por muito mais do que essa tão bela e tradicional festa brasileira. Junho também é marcado pela luta histórica e vibrante da parada LGBTQIAP+, que teve início nos anos 90, e em São Paulo mais especificamente em 1997.


Os anos noventa foram fundamentais para a comunidade e as pessoas que nela se inserem terem cada vez mais papel no mundo público. Renan Quinalha em seu livro “Movimento LGBTI+”: “Os anos de 1990, nesse sentido, foram fundamentais para uma saída do armário por parte da comunidade LGBTI+. O acúmulo de anos de experiência de ativismo organizado, um diálogo bem estabelecido com diversas instituições do estado, a consolidação de um mercado voltado para esse segmento, a presença cada vez mais marcante de uma subcultura LGBTI+ são elementos que atestam o crescimento reconhecido dessa população pelo conjunto da sociedade.”


As paradas que se espalham hoje pelo Brasil tem um papel fundamental para a luta da comunidade no país que mais mata LGBTQIAP+ no mundo, segundo dado divulgado pelo Observatório de Mortes e Violências LGBTI+ no Brasil e disponibilizado pelo site Grupo Gay da Bahia: “O Brasil continuou sendo em 2023 o campeão mundial de homicídios e suicídios de LGBT+: 257 mortes violentas documentadas, um caso a mais do registrado em 2022. Uma morte a cada 34 horas! Os dados são divulgados desde 1980 (44 anos) pelo Grupo Gay da Bahia (GGB), a mais antiga ONG LGBT da América Latina.”, já os dados divulgados pelo último dossiê da ANTRA (Associação Nacional de Travestis e Transexuais): “Em 2024, foram assassinadas 122 pessoas trans e travestis. No comparativo entre os anos de 2023 e 2024, foi percebida uma queda de 16% no número de assassinatos contra pessoas trans, de 145 em 2023 para 122 em 2024”. Esses dados deixam cada vez mais claro a necessidade pungente dessa comunidade se organizar politicamente e a parada é sim, um papel importante nessa luta.


É crucial que entendamos que esse movimento, que se iniciou na década de 90 no Brasil e que até hoje marca a luta LGBTQIAP+, é um símbolo para aqueles que já se consolidaram dentro desta, mas também para aqueles(as) que ainda estão tentando descobrir suas próprias existências dentro da nossa sociedade; ou seja, é fundamental pensar no futuro social e político do país, e as novas gerações que estão surgindo precisam ter uma conexão com a parada, uma ligação política e de luta pelos seus direitos. Quando Jair Bolsonaro assumiu a presidência e com ele (re)ergueu-se um movimento de extrema direita no Brasil e, portanto, um ataque sistemático à vida pública e privada de pessoas da comunidade LGBTQIAP+. 


Os direitos que conquistamos até aqui estão atrelados a uma boa vontade política de um grupo que pode ou não ter interesse em nossas demandas - normalmente não há interesse algum -, isso traz consigo uma fragilidade que não podemos nos permitir ter.


Por muito, sabemos que as paradas vem sendo utilizada como um mecanismo de ataque a comunidade por parte daquela extrema-direita, que usam de nossa liberdade e luta para propagar mentiras e calúnias sobre o movimento, mas ao mesmo tempo é capitalizada pelos estados e empresas muitas vezes ligadas a essa extrema-direita para um maior fim lucrativo, ou seja, de olho no famoso e bem discutido Pink Money. O que precisamos nos atentar sempre é a necessidade diária pela luta, e quando escrevo sobre esse tema me vem ativamente a vontade de deixar claro que a comunidade precisa hoje, e sempre, lutar por sua existência; não podemos de maneira alguma pensar que esse sistema está de alguma forma ao nosso lado, ou seja, é necessário lutar por nosso direito à vida e existência dentro desta sociedade. A parada, um marco histórico pela vida das pessoas LGBTQIAP+, e este sentimento não pode ser capitalizado por esses grupos extremistas e empresas, por isso tomamos as ruas de São Paulo no último dia 21, com a 23ª Caminhada de Mulheres Lésbicas e Bissexuais de São Paulo e em 23 de junho com a Parada do Orgulho LGBT+ de São Paulo que discutiu o envelhecer de nossa comunidade, memória, resistência e futuro, e por fim no próximo dia 27 com a 8ª Marcha do Orgulho Trans da Cidade de São Paulo, pois estamos aqui e vivos disputando sempre por nossa liberdade, nossas vidas.


Por fim, deixo aqui claro que a luta pela nossa existência é também uma luta contra o capital. Enquanto houver a hegemonia desse sistema produtivo não haverá a completa liberdade que tanto pensamos e desejamos. Ocupar as paradas é gritar para o mundo todo que estamos aqui, fortes e unidos, e não vamos nunca mais nos calar. Ocupem as ruas, os espaços, ergam suas bandeiras e desbravem a vida do ontem e do novo amanhã, onde o mundo é mais colorido do que cinza.



*Historiador, pós-graduado em Letras. Professor da rede estadual de São Paulo e editor da Clio Operária. Filiado ao PSOL desde 2019.


Referências


QUINALHA, Renan. Movimento LGBTI+: Uma breve história do século XIX aos nossos dias. Belo Horizonte: Autêntica, 2022.


BENEVIDES, Bruna G. Dossiê: assassinatos e violências contra travestis e transexuais brasileiras em 2024. ANTRA, 2024. Disponível em: https://antrabrasil.org/assassinatos/


DA BAHIA, Grupo Gay. Dossiê: Observatório 2023 de Mortes Violentas de LGBT+ no Brasil,. GGB, 2023. Disponível em: https://grupogaydabahia.com.br/observatorio-da-violencia/


 
 
 

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