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ROTEIRO [T05E02] Angela Davis e a futura democracia da abolição - Caverna do Morcego

** Roteiro de vídeo disponibilizado no youtube para a playlist sobre lei de drogas, encarceramento em massa e violência policial para o canal Caverna do Morcego: (T01E01) A polícia deve acabar? 


“Essa fama se fundamentou na mobilização do Estado e nos seus esforços para me capturar, incluindo o fato de eu ter sido inserida na lista dos Dez Mais Procurados pelo FBI. Mas eu também sabia, e talvez este seja o ponto mais importante, que o meu potencial como assunto autobiográfico havia sido criado pelo gigantesco movimento global que conseguiu a minha liberdade”. Sabe de quem falamos? Angela Davis, que se insere, a partir de uma autobiografia vinculada aos movimentos e campanhas que partiam de comunidades de luta, como sua “história dentro da tradição de narrativas de escravos negros”. E, também, aqui em minhas palavras, como uma militante incrível que carrega os laços de solidariedade, expandido elas para além do indivíduo, e sendo recepcionada calorosamente por quem luta.


Hoje começamos a trabalhar em cima de uma série de entrevistas da autora, discutindo o fim das prisões, imperialismo, libertação e emancipação e dando longos toque sobre organização política. Além de professora emérita na Universidade da Califórnia, luta pela libertação palestina, é referência na luta pelos direitos civis, das mulheres e pela luta pelo poder negro, tendo feito parte do partido comunista e com proximidade a partir da luta com os Panteras Negras.


Eu sou o Marcos Morcego e estou aqui para darmos início à quinta temporada de episódios sobre Lei de Drogas, Encarceramento em Massa e Violência Policial. Passados nossos debates sobre violência policial, nas primeiras temporadas, e nas mais recentes sobre lei de drogas, começaremos a abordar a questão das prisões. Com a ideia de mostrar também uma pluralidade de elementos, ao se falar sobre a questão do encarceramento, visitaremos escritos que trazem perspectivas diferentes e elementos que se conectam, tanto para fugir de um debate puramente teórico, mas para demonstrar a vitalidade desse campo como base para diversas lutas. E, sempre que possível trazendo uma indicação de evento ou uma galera para acompanhar!


Hoje abriremos o livro: A Democracia da Abolição: para além do império, das prisões e da tortura. Trabalhando com suas entrevistas em que “analisa como sistemas históricos de opressão continuam a influenciar e solapar a democracia na atualidade e investiga a noção de “democracia da abolição” como a democracia por vir, um conjunto de relações sociais livres da opressão e da injustiça” [1]


Sou comunicador político, aqui na Caverna do Morcego, e esse é um projeto que atravessou minha vida, tanto enquanto militância, quanto em trampos com editoras que apareceram, geralmente também vinculadas às lutas. Além desse quadro, aqui no nosso canal também temos o projeto de Leitura e Discussão, que são vídeos semanais, lendo e disponibilizando o pdf. Também temos nosso podcast: Caverna do Morcego, disponível em quase todos esses aplicativos que da pra ouvir coisa.


Não se esqueçam de: curtir, comentar e compartilhar. Também sigam nossas redes sociais: @morcego_marcos_ no instagram e marcosmorcego.bsky.social, no bluesky.


Agora os agradecimentos:


Autonomia Literária, em que temos o cupom #MorcegonaAutonomia rolando, que garante 20% de desconto em todos os produtos do site [2];


Clio Operária, nossa revista maravilhosa, em que produzo artigos e sou editor e que conta com uma equipe muito pesada [3]; Contando com uma coisa muito especial, agora os roteiros da nossa série sobre Lei de Drogas, Encarceramento em Massa e Violência policial, serão publicados no nosso site eihn!?


E Editora Terra Sem Amos, editora pela qual publiquei meu livro: Por uma implosão da sociologia [4]. Lembrando que todo nosso roteiro será disponibilizado no site da Clio Operária.


Antes de entrar em suas entrevistas, suas opiniões, resgatamos a abertura e introdução do livro, feita por Eduardo Mendieta, destacando a múltipla faceta dessa militante radical, tanto enquanto “candidata à vice-presidência do Partido Comunista dos Estados Unidos”, “como uma grande autoridade feminista”, e que, para nós, tem uma importância particular, não só pelos seus livros e luta, mas também porque, quando pisou no Brasil, destacou a importância do feminismo negro aqui, principalmente na voz e luta de Lélia Gonzalez. Uma militante antiprisional, que carrega a questão racial, de gênero e de classe em toda sua trajetória. Estamos falando de uma das “pessoas mais procuradas pelo FBI sob falsas acusações”, e que “foi levada à clandestinidade, detida e encarcerada”. Tendo ficado em confinamento por 16 meses, trazendo, portanto, não só a perspectiva histórica e de luta, mas seguindo Marighella, Abdias Nascimento, Abdullah Öcallan e muitas outras pessoas, com a perspectiva de quem esteve “dentro do sistema”.


É quem resgata Frederick Douglass, não sem críticas, mas pontuando o enfrentamento da luta negra desde o período da escravidão e conectando seus pontos com a estrutura sádica e violenta da justiça, dos setores armados do Estado e da própria prisão. Em um sistema que, mesmo após “um processo de democratização espantoso e utópico”, até senadores negros foram eleitos, após a escravidão, assistiu na mesma velocidade, uma nova versão do sistema, que vigiava e punia, com leis formadas para encarcerar e violentar a população negra, além de os colocarem em um regime de trabalho, mesmo de dentro da prisão, um “sistema de locação de mão de obra prisional”.


Nas palavras de Du Bois, que retiro desse livro:


“Esse sistema penitenciário [o sistema de locação de mão de obra prisional] começou a caracterizar todo o sul. Na Geórgia, com a explosão da guerra da Secessão [...], não havia condenados negros, já que, sob a doutrina da escravidão, os negros eram punidos nas fazendas. Os condenados brancos eram libertados para lutar no exército confederado. Todo o sistema criminal veio a ser utilizado como método para manter os negros no trabalho e intimidá-los. Por conseguinte, teve início uma demanda de cadeias e penitenciárias além da exigência natural, devido ao aumento da criminalidade”.


A própria lei, seja na escravidão, seja no processo de formar uma cadeia produtiva a partir do sistema prisional, seja com as leis segregacionistas, seja atualmente na gestão Trump, diferente do que Douglass pressupunha, na verdade justifica e permite esse modelo de dominação. Uma justiça que “poderia ser usada - e de fato FOI usada - para rotular os seres humanos negros de criminosos”. Algo que é visto em Du Bois, entendendo “como o Estado participou da criminalização dos negros, de modo que sua mão de obra pudesse ser extraída através do mecanismo do sistema de locação de mão de obra prisional”.

É a passagem de um modelo escravista para um modelo democrático que mantém suas bases, a famosa mudança sem transformação, descrita no Brasil por Clóvis Moura, Florestan Fernandes, Lélia Gonzalez e Jacob Gorender. Foi uma forma de prometer uma democracia que nunca se concretizou. “na abolição da escravidão. Com ela, os negros deixaram de ser escravos, mas imediatamente se tornaram criminosos - e, como criminosos, tornaram-se escravos do Estado. Dessa forma, Du Bois representa para Davis uma perspectiva anticapitalista, antiestatal, antilegal, que é profundamente pertinente ao que nós chamamos de imaginário social, ou imaginação cívica”.


Angela Davis pensa, então, em certos elementos que o Estado se utiliza e que traz sentido para esse modelo, como:


  1. A privação de votos para, como chamado nos EUA, as pessoas de cor;

  2. A extração de capital, literalmente sobre pessoas tratadas como recursos que produzem mais recursos, e já que, “em nenhum momento, dada a quantidade exorbitante de negros nas prisões, a riqueza social retorna às comunidades negras”;

  3. A rotulação social, a criação de um olhar sádico, a construção de um estigma que confunde e embaralha “o povo”;

  4. É a manutenção do contrato racial, que “contribui para a dominação das minorias raciais ao domesticar a imaginação cívica dos norte-americanos brancos”;

  5. Com isso a violência é permitida, inclusive no nosso cotidiano e entre a gente, algo que se estende para uma coerção social, principalmente contra mulheres, mas também com o racismo em seus componentes.

  6. Se forma assim a institucionalização dos setores de repressão e uma aceitação por parte da população;

  7. Um “complexo industrial-prisional”, segundo a autora, que se relaciona diretamente com o “complexo industrial-militar”, talvez a luta Palestina e dos povos rebeldes da América Latina, na luta por emancipação, enquanto o sistema prisional e militar se associa com grandes triângulos de violência, em que enquanto campos de concentração são formados, as armas de israel reprimem os favelados e periféricos brasileiros.


Então falaremos, a partir de suas palavras, o que enxergamos e para onde iremos, pensando “a democracia que está por vir”. A abolição se torna esse centro que por um lado nega essa sociedade que se estrutura em acumulações e violências incessantes, que nega “uma democracia falsa desse tipo [que] reduz o povo e suas comunidades à subsistência biológica mais crua”. É a negação de um sistema que pune, que violenta, que explora e que oprime, abrindo espaço para a imaginação mais radical de uma sociedade em que, como diz Rosa Luxemburgo, “sejamos socialmente iguais, humanamente diferentes e totalmente livres”.


- FIM -


Referências:

1- A Democracia da Abolição: Para além do império, das prisões e da tortura. Angela Davis. Difel.

3- Revista Clio Operária: Clio Operária | Revista

4- Site da Editora Terra Sem Amos: Loja online de Editora Terra sem Amos / Drive com o livro gratuito MEGA


 
 
 

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