A Amazônia é um sinal?
- Professor Poiato
- 24 de mar.
- 5 min de leitura
Por William Poiato
Imagine um mundo onde a natureza não é mais um recurso a ser explorado, mas um sistema vivo em equilíbrio com a sociedade. Agora, abra os olhos: estamos longe disso. A crise ambiental que vivemos hoje não é um acidente, mas o resultado de um sistema econômico que transforma tudo em mercadoria, inclusive a própria natureza. Como podemos entender essa dinâmica e suas consequências para o planeta e para a humanidade?
A Falha Metabólica
O conceito marxista de metabolismo social ajuda a explicar como o capitalismo rompeu o equilíbrio entre sociedade e natureza. A Revolução Industrial é apontada como um marco nesse processo, ao intensificar a separação entre campo e cidade, a especialização econômica e a exploração insustentável dos recursos naturais. A falha metabólica é, portanto, a expressão dessa ruptura, onde a natureza deixa de ser um sistema integrado à vida humana e passa a ser vista como um recurso infinito a ser explorado.
A financeirização da natureza é uma nova fase dessa falha metabólica. Nessa etapa, os recursos naturais são transformados em ativos financeiros, como créditos de carbono e títulos de biodiversidade. Esse processo não apenas aprofunda a degradação ambiental, mas também amplia as desigualdades entre países centrais e periféricos. Enquanto os primeiros se beneficiam da mercantilização da natureza, os segundos arcam com os custos sociais e ambientais dessa exploração.
O Desmatamento na Amazônia
Na mesma esteira, o desmatamento na Amazônia é um fenômeno complexo, influenciado por fatores econômicos, políticos e sociais. A expansão agropecuária é apontada como o principal motor do desmatamento, impulsionada por políticas públicas que incentivam a ocupação territorial e a exploração de recursos naturais. A pecuária extensiva e a monocultura de commodities, como a soja, são exemplos claros de como o capitalismo transforma a floresta em mercadoria.
O tamanho do dano causado pelo desmatamento na Amazônia ao longo dos anos é alarmante. Estima-se que, desde o início do monitoramento sistemático, milhões de quilômetros quadrados de floresta tenham sido perdidos. Por exemplo, entre 1988 e 2023, o desmatamento acumulado na Amazônia Legal brasileira ultrapassou 500.000 km², uma área equivalente a mais de duas vezes o tamanho do estado de São Paulo. Em 2021, o desmatamento atingiu o maior patamar da década, com mais de 13.000 km² de floresta destruídos, segundo dados do Prodes/Inpe.De agosto de 2023 a julho de 2024, o desmatamento na Amazônia atingiu 6.288 km², registrando uma queda de ritmo de 30,6% em comparação com o período anterior, conforme dados do Inpe. Especificamente em 2024, o mês de agosto apresentou o menor índice de desmatamento dos últimos seis anos. Além disso, no acumulado de janeiro a agosto de 2024, houve uma redução de 24% em relação ao mesmo período de 2023, com destaque para janeiro, quando o desmatamento caiu 60% em comparação com janeiro de 2023. Já em 2023, o desmatamento na Amazônia diminuiu 21,8% em relação a 2022, enquanto a degradação de vegetação não florestal recuou 19,5% no mesmo período. Em contraste, 2021 foi marcado pelo maior desmatamento da Amazônia dos últimos dez anos, segundo o Imazon. Parece bom, mas os dados são que o ritmo diminui, não que cessou e muito menos de recuperação florestal.
O desmatamento não é apenas resultado de atividades econômicas, mas também de uma governança ambiental frágil. A ausência de fiscalização efetiva, a falta de políticas públicas consistentes e a desigualdade socioeconômica são fatores que agravam o problema. Além disso, o desmatamento tem impactos profundos sobre as comunidades locais, que muitas vezes são expulsas de seus territórios ou têm suas práticas tradicionais criminalizadas.
Campo de Disputa
A fricção conceitual entre a falha metabólica e o desmatamento na Amazônia revela um ponto central: a questão ambiental é um campo de disputa entre diferentes lógicas de organização social e econômica. De um lado, temos a lógica capitalista, que transforma a natureza em mercadoria e aprofunda as desigualdades sociais. De outro, temos a necessidade urgente de construir uma relação sustentável entre sociedade e natureza, baseada na justiça social e no respeito aos limites ecológicos do planeta.
A financeirização da natureza é um exemplo claro dessa disputa. Ao transformar recursos naturais em ativos financeiros, o capitalismo não apenas perpetua a exploração ambiental, mas também cria novas formas de acumulação de riqueza. No entanto, essa lógica encontra resistência nas comunidades locais e nos movimentos socioambientais, que lutam pela preservação da floresta e pelos direitos das populações tradicionais.
A Financeirização da Natureza e seus Impactos na Amazônia
A financeirização da natureza tem impactos diretos na Amazônia. A transformação de recursos naturais em ativos cria uma nova dinâmica de exploração que aprofunda a degradação ambiental e as desigualdades sociais. Enquanto empresas e países ricos compram créditos de carbono para compensar suas emissões, comunidades locais são expulsas de seus territórios e têm suas práticas tradicionais criminalizadas.
Além disso, a financeirização da natureza perpetua a lógica de mercado que prioriza o lucro em detrimento da vida. Tal mercantilização, apesar da forma como se vende, não resolve a crise ambiental, mas apenas transfere o problema para outros lugares e populações. Na Amazônia, isso se reflete na expansão da fronteira agrícola e na exploração insustentável de recursos naturais, que têm impactos devastadores sobre a biodiversidade e o clima.
O Estado
As políticas públicas e a governança ambiental para conter o desmatamento na Amazônia. No entanto, muitas políticas públicas têm efeitos contraditórios, incentivando a exploração de recursos naturais em vez de promover a sustentabilidade. Por exemplo, subsídios agrícolas e créditos facilitados para a pecuária extensiva são fatores que contribuem para o desmatamento, ao mesmo tempo em que políticas de fiscalização ambiental são insuficientes para conter a degradação.
A governança ambiental, portanto, é um campo de disputa onde diferentes interesses entram em conflito. De um lado, temos as empresas e os governos que priorizam o crescimento econômico e a exploração de recursos naturais. De outro, temos as comunidades locais e os movimentos socioambientais que lutam pela preservação da floresta e pelos direitos das populações tradicionais. A superação, portanto, só pode surgir do próprio conflito, iminente e inevitável.
Para Além
A crise ambiental que vivemos hoje não é um problema isolado, mas o resultado de um sistema econômico que prioriza o lucro em detrimento da vida. A falha metabólica e o desmatamento na Amazônia são duas faces da mesma moeda, expressões de uma lógica predatória que precisa ser urgentemente superada.
A superação dessa crise exige a construção de uma nova relação entre sociedade e natureza, baseada na sustentabilidade e na justiça social. Isso implica não apenas mudanças nas políticas públicas e nas práticas econômicas, mas também uma transformação profunda em nossa forma de pensar e agir, a luta pela sustentabilidade é também uma luta pela emancipação humana.
E você, leitor, está disposto a participar dessa transformação?
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Referências:
ARAÚJO, N. M. S.; SILVA, M. das G. e. O metabolismo social e sua ruptura no capitalismo: aspectos históricos e sua configuração na etapa da financeirização da natureza. Germinal: Marxismo e Educação em Debate, v. 13, n. 2, p. 151-173, 2021. https://doi.org/10.9771/gmed.v13i2.4530
ARRAES, Ronaldo de Albuquerque; MARIANO, Francisca Zilania; SIMONASSI, Andrei Gomes. Causas do desmatamento no Brasil e seu ordenamento no contexto mundial. Revista de Economia e Sociologia Rural, v. 50, p. 119-140, 2012.
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